domingo, 29 de julho de 2012

A poesia de Lívia Natália

Lívia Maria Natália de Souza Santos nasceu em Salvador – BA em 1979. Filha de Osun, criou-se nas dunas no Abaeté e, segundo a autora, alimentada por Iemanjá, muito se banhou na poética praia de Itapuã. Talvez por isto as águas sejam seu grande tema em Água negra, livro de estreia, ganhador do Concurso Literário do Banco Capital em 2011 Categoria Poesia, e de Correntezas, seu próximo livro de poemas. Consagrada a Osun e Odé no Terreiro Ilê Asé Obanan, a vivência no Candomblé de fundamento Ketu é um dos temas mais fortes de sua escrita, na qual comparecem também temáticas relativas à vivência da mulher negra com seu corpo, cabelos e todos os signos etnicorraciais que atravessam, buscando subverter conceitos e reinventar modos de ser.
Lívia Natália é Mestre (2005) e Doutora (2008) em Teorias e Crítica da Literatura e da Cultura pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Atualmente é Professora Adjunta do setor de Teoria da Literatura da UFBA, onde coordena os grupos de pesquisa Derivas da Subjetividade na Escrita Contemporânea, no qual pesquisa literatura contemporânea escrita em Blogues, e Corpus Dissidente: Poéticas da Subalternidade em escritas e estéticas da diferença, no qual se dedica a estudar a Literatura Negra escrita por mulheres no Brasil e nos PALOP, com recorte em gênero, raça e sexualidades.


Além de ensinar disciplinas ligadas ao campo da Teoria da Literatura na UFBA, também coordena e ministra Oficinas de Criação Literária nesta Universidade e em projetos, para crianças em situação de risco. Atualmente, faz formação em Psicanálise Clínica.


Rastro

Somos todos feitos da poeira de estrelas.
Elas apenas tangenciam nossos sonhos
inscrevendo-os na pele do infinito.

O grão de brilho puro
rouba sua luz da memória do sol.
E, em sendo lembrança só,
gira fugidio à orla do céu imenso.

Há, na trama retecida da minha alma,
um ressoar silente como o das estrelas,
a que chamo angústia,
apesar da poeira luminosa e viva
que trago debaixo dos pés.

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Motivo

Eu canto porque o instante existe

e a minha vida está completa.

Não sou alegre nem sou triste:

sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,

não sinto gozo nem tormento.

Atravesso noites e dias

no vento.

Se desmorono ou se edifico,

se permaneço ou me desfaço,

— não sei, não sei. Não sei se fico

ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.

Tem sangue eterno a asa ritmada.

E um dia sei que estarei mudo:

— mais nada.

Cecília Meireles